Mario de Sa-Carneiro – Angulo

*ANGULO*

Aonde irei neste sem-fim perdido,
Neste mar ôco de certezas mortas?—
Fingidas, afinal, todas as portas
Que no dique julguei ter construido…

—Barcaças dos meus impetos tigrados,
Que oceano vos dormiram de Segrêdo?
Partiste-vos, transportes encantados,
De embate, em alma ao rôxo, a que rochêdo?…

—Ó nau de festa, ó ruiva de aventura
Onde, em Champanhe, a minha ansia ia,
Quebraste-vos tambem ou, por ventura,
Fundeaste a Ouro em portos d’alquimia?…

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Chegaram á baía os galeões
Com as séte Princesas que morreram.
Regatas de luar não se correram…
As bandeiras velaram-se, orações…

Detive-me na ponte, debruçado,
Mas a ponte era falsa—e derradeira.
Segui no cais. O cais era abaulado,
Cais fingido sem mar á sua beira…

—Por sôbre o que Eu não sou ha grandes pontes
Que um outro, só metade, quer passar
Em miragens de falsos horizontes—
Um outro que eu não posso acorrentar…

Barcelona—Setembro de 1914