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Uma economia de doação (do inglês gift economy, economia de doação ou economia de oferta) é um sistema econômico em que os participantes doam coisas de valor para o benefício compartilhado da comunidade. Sistemas deste tipo ocorrem geralmente em contextos culturais onde existe uma expectativa de retorno (na forma de bens ou serviços de valor comparável, ou apoio político, lealdade, honra para o dador, etc.) ou de que a dádiva seja passada adiante de alguma maneira.

Economias de doação coexistem com economias de comando e economias de mercado, ou ainda economias de escambo, mas algumas pessoas pensam que essa coexistência é prejudicial em longo termo para as economias de doação, pois não há competição nestas últimas, e elas acabam se tornando reféns de políticas de reserva de fundos.

[editar] História

Marshall Sahlins escreve que economias de oferta da Idade da Pedra eram, pela sua natureza de economias de oferta, economias de abundância, não de escassez, apesar do seu estatuto típico de pobreza objectiva. Lewis Hyde localiza a origem das economias de oferta na partilha de comida. O potlach, ritual índio frequentemente citado como um dos modelos de economia de oferta, também se originou como um “grande banquete”. Hyde argumenta que isto levou à formação da noção largamente difundida de que uma oferta deve ser algo perecível. Muitas sociedades têm fortes proibições em relação ao uso de ofertas como bens ou capital. O antropologista Wendy James escreve que entre os Uduk do nordeste africano há um forte costume de que qualquer oferta que cruze as fronteiras da tribo tenha que ser consumido, e não investido. Por exemplo, um animal doado como oferta tem que ser comido, e não procriado. No entanto, este perecimento da oferta pode não consistir no seu consumo, mas sim na passagem da dádiva para frente, para outros. Há sociedades em que se trata de dar outra oferta, quer directamente em retorno quer a um terceiro. Ficar com a oferta e não dar outra em troca é repreensível. “Em lendas populares”, nota Hyde, “a pessoa que tenta parar uma corrente de ofertas geralmente morre.”

[editar] O Problema da Pobreza

Um dos possíveis benefícios de uma economia de oferta (o qual esta tem em comum com algumas economias de comando, como o comunismo) é que pode prover as necessidades dos que não possuem no momento meios de retribuir. Por exemplo, se alguns indivíduos numa sociedade são tão pobres que não possuam nenhum bem material para trocar nem nenhum bem ou dinheiro para comercializar, eles podem ainda receber caridade se existirem recursos suficientes.

Alguns autores têm sugerido que modalidades de economias de oferta possam ser a chave para quebrar o ciclo da pobreza. Esta posição — e a reformulação de toda a sociedade para uma economia de oferta — é particularmente característica do Anarco-Comunismo. Os Anarco-comunistas defendem uma economia de oferta pura como ideal, sem dinheiro, nem mercados, nem planeamento central da economia. As origens desta visão podem ser traçadas até Peter Kropotkin, que verificou nas tribos de caçadores-recolectores que visitou, o paradigma da “ajuda mútua”.

[editar] Exemplos na cultura moderna

Elementos de economias de oferta existem profusamente integradas na economia mundial contemporânea.

• Adopção

Em muitas sociedades, pode-se dar um filho para adopção, mas não se pode vender o próprio filho.

• Sexo

Também é frequente ser legal e tolerada praticamente toda a actividade sexual entre adultos, desde que não haja troca de dinheiro envolvida no processo. Se isso se verificar, o acto é considerado em muitas sociedades como reprovável ou mesmo criminoso.

• Doação de órgãos

A doação de órgãos é activamente encorajada; no entanto, a venda de órgãos é considerada quase universalmente um crime grave. A maior parte dos sistemas de doação de órgãos não dão nenhum tipo de compensação ao doador ou à sua família;

• Bancos de sangue

O sistema de bancos de sangue prevalente em vários países não dá nenhuma recompensa significante por doações de sangue. Pagamentos nesta área são frequentemente considerados suspeitos, se não até criminosos.

• Informação

A informação é um bem particularmente bem adaptado para economias de oferta. Por um lado, a informação pode ser transmitida e copiada a praticamente custo zero; por outro, a informação é o que se chama de bem nonrival: quando se dá informação, não se perde o todo nem parte da informação que se tem (embora se possam perder certos benefícios que poderiam ser ganhos na economia de mercado a partir dos direitos de propriedade intelectual).

• • Internet

A Internet é provavelmente o exemplo mais bem sucedido de uma economia de oferta aplicada à informação. A grande maioria dos milhões de páginas existentes está disponível para consulta gratuita, sem que os autores recebam qualquer pagamento derivado dessa consulta. A Wikipedia é um óptimo exemplo desse conceito: a enciclopédia on-line é gratuita e foi construída inteiramente por contribuições de milhares de voluntários, estando disponível a sua edição a qualquer internauta que queira contribuir com informação que ainda não exista na mesma.

• • Ciência

A pesquisa científica tradicional é também uma economia de oferta de informação. Os cientistas produzem artigos e oferecem-nos à comunidade científica através de jornais e revistas de ciência, e conferências. Outros cientistas utilizam e citam livremente o conteúdo desses artigos nos seus próprios trabalhos. Quanto mais referenciado for um cientista, maior é o seu prestígio, o que pode facilitar a obtenção de fundos e de posições; e toda a comunidade científica beneficia do acréscimo ao conhecimento disponível.

• • Open-Source

A comunidade de software livre é outro exemplo de uma economia de oferta de informação. Os programadores elaboram o código-fonte e disponibilizam-no gratuitamente, permitindo livremente a cópia e a modificação/melhoramento do código. Os programadores individuais são assim mais prestigiados e respeitados, e a comunidade num todo beneficia de melhor software.

• Famílias

Economias de oferta em pequena escala existem também na maior parte das famílias, com ofertas de tempo, dinheiro, alimento, protecção, e conhecimento empírico sendo dados sem qualquer negociação prévia de retribuição. Na grande maioria das sociedades, os pais sustentam os filhos pelo menos durante a infância (e, nalgumas sociedades, até após a adolescência e a maioridade) sem o estabelecimento explícito de uma obrigação de retorno, mas sim um dever implícito de fazer o mesmo à geração seguinte.

• Festas

Similarmente, festas podem ser consideradas como sendo economias de oferta em pequena escala especial e temporal, nas quais comida, bebidas, acomodação, entretenimento, música e o espaço são cedidos livremente, com a maior parte dos participantes contribuindo de forma informal e não directamente relacionada com o que consomem.

[editar] Referências

• Marcel Mauss: Essai sur le don. Forme et raison de l'échange dans les sociétés archaïques in 1925.
• Lewis Hyde: The Gift: Imagination and the Erotic Life of Property, 1983 (ISBN 0394715195), especialmente a parte I, "A Theory of Gifts", parte do qual foi originalmente publicado como "The Gift Must Always Move" na Co-Evolution Quarterly No. 35, Fall 1982.
• Titmuss, Richard, The Gift Relationship: From Human Blood to Social Policy (1970). Reprinted by the New Press, ISBN 1565844033.