Forte Coligny
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O Forte Coligny (em francês, Fort Coligny), localizava-se na ilha de Serigipe (hoje ilha de Villegaignon), no interior da baía de Guanabara, na atual cidade e estado do Rio de Janeiro, no Brasil.
Esta fortificação foi o núcleo do estabelecimento colonial francês conhecido como França Antártica (1555-1560), sob o comando de Nicolas Durand de Villegagnon (1510-1571).
Principiado ainda em 1555, após uma frustada tentativa de estabelecimento de uma bateria artilhada na Isle Rattier, em Março de 1557 uma segunda expedição, sob o comando do Capitão Bois-le-Compte, sobrinho de Villegagnon, chegou à Guanabara com reforços: três navios novos e bem artilhados, transportando 290 colonos.
O calvinista Jean de Léry, integrante desse reforço, resumiu a chegada dos primeiros franceses ("Histoire d'un voyage faict en la terre du Brésil, autrement dite Amerique". La Rochelle, 1578):
- "(...) Assim, antes de partir de França, Villegagnon prometeu a alguns honrados personagens que o acompanharam, fundar um puro serviço de Deus no lugar em que se estabelecesse. E depois de aliciar os marinheiros e artesãos necessários, partiu em Maio de 1555, chegando ao Brasil em novembro, após muitas tormentas e toda a espécie de dificuldades.
- Aí aportando, desembarcou e tratou imediatamente de alojar-se em um rochedo na embocadura de um braço de mar ou rio de água salgada a que os indígenas chamavam Guanabara e que (como descreverei oportunamente) fica a 23° abaixo do Equador, quase à altura do Trópico de Capricórnio. Mas o mar daí o expulsou. Constrangido a retirar-se avançou quase uma légua em busca de terra e acabou por acomodar-se numa ilha antes deserta, onde, depois de desembarcar sua artilharia e demais bagagens, iniciou a construção de um forte, a fim de garantir-se tanto contra os selvagens como contra os portugueses que viajavam para o Brasil e aí já possuem inúmeras fortalezas." (LÉRY, 1972:22)
Específicamente sobre a ilha e a sua fortificação, prossegue:
- " Uma légua mais adiante, encontra-se a ilha onde nos instalamos e que, como já observei, era desabitada antes de Villegagnon chegar ao país; com meia milha de circunferência e seis vezes mais comprida do que larga, e rodeada de pedras à flor d'água, o que impede se aproximem os navios mais perto do que a distância de um tiro de canhão, e a torna naturalmente fortificada. Com efeito ninguém pode ali atracar, nem mesmo em pequenos barcos, a não ser pelo lado do porto, situado em posição contrária ao mar alto. Bem guarnecida, não fora possível forçá-la nem surpreendê-la, como depois de nosso regresso o fizeram os portugueses por culpa dos que lá ficaram. Ademais, nas extremidades dessa ilha existem dois morros nos quais Villegagnon mandou construir duas casinhas, edificando a sua, em que residiu, no centro da ilha em uma pedra de cinqüenta a sessenta pés de altura. De ambos os lados desse rochedo, aplainamos e preparamos pequenos espaços onde se construíram não só a sala, onde nos reuníamos para a prédica e a refeição, mas ainda vários outros abrigos em que se acomodavam cerca de oitenta pessoas, inclusive a comitiva de Villegagnon. Entretanto, a não ser a casa situada no rochedo, construída com madeiramento, e alguns baluartes para artilharia, revestidos de alvenaria, o resto não passava de casebres de pau tosco e palha construídos à moda dos selvagens, que de fato os fizeram. Eis, em poucas palavras, em que consistia o forte que Villegagnon denominou Coligny, pensando ser agradável ao senhor Gaspard de Coligny, almirante de França, sem o apoio do qual, como já disse no início, jamais tivera meios de fazer a viagem nem de construir nenhum forte no Brasil." (op. cit., p. 68-69)
O forte foi penosamente erguido com a mão-de-obra indígena (cerca 40 escravos adquiridos aos Tupinambás) e dos colonos:
- "(...) Como sobremesa [ao jantar da recepção] própria para refazer-nos dos trabalhos do mar mandaram-nos carregar pedras e terra para as obras do forte de Coligny, que se achava em construção. (...) Assim, já de chegada e nos dias seguintes, sem necessidade nenhuma e sem nenhuma atenção ao estado de debilidade em que nos encontravamos por causa da viagem, (...) obrigou-nos Villegagnon a carregar terra e pedras para o seu fortim e isso desde a madrugada até à noite, apesar de nossa fraqueza, o que por certo constituía um tratamento mais rude que fora de esperar de um pai. Todavia (...) não houve entre nós quem não trabalhasse com alegria, acima de suas forças e por espaço de quase um mês naqueles serviços a que não estávamos acostumados." (op. cit., p. 52-53).
Embora a colônia tenha apresentado um bom desenvolvimento inicial, as rígidas normas disciplinares de Villegagnon acabaram por dividir os colonos. Desde Fevereiro de 1556 parte deles abandonou o abrigo da ilha para viver com os indígenas, parte retornou à França, onde as suas denúncias fazem abortar a organização de uma terceira expedição com reforços. Em Outubro de 1558, Villegagnon voltou à França, deixando Bois-le-Comte no governo da França Antártica.
Nesse momento ocorreu a reação dos portugueses, que armaram uma expedição para expulsar os invasores. Sob o comando do Governador Geral Mem de Sá (1558-1572), 120 portugueses apoiados por cerca de 140 índios flecheiros em canoas, Tupinambás e Temiminós, cercaram a ilha, defendida por 74 franceses com o apoio de cerca de 1.000 índios Tamoios, intimando Bois-le-Comte à rendição. Ante a negativa, após vinte dias de cerco, atacaram o fortim na manhã de 15 de Março de 1560.
Um marujo português, nadando até à ilha, fez saltar o paiol de pólvora, levando os franceses a desistirem da luta e fugir, a maioria para a França e cerca de 20 para o continente, onde se abrigaram junto aos aldeamentos indígenas aliados. A fortificação assim conquistada (16 de Março), foi arrasada, uma vez que Mem de Sá com os navios avariados e poucos homens, não dispunha de recursos para um estabelecimento definitivo na baía de Guanabara, regressando, a 3 de Abril, a Salvador.
Um outro testemunho da aventura francesa na Guanabara é dado pelo frade franciscano André Thevet, que, integrando a primeira expedição, aqui permaneceu de Novembro de 1555 a Janeiro de 1556, publicando as suas observações na obra "Les singularitez de la france antartique" (1557). O ataque português à chamada Isle Henri (1560) está relatado em carta do mesmo Thevet publicada na obra "La cosmographie universelle" (1571).
Ao final da campanha, Mem de Sá relatou à Regente:
- "Suposto que vi muito e li menos, a mim me parece que se não viu outra fortaleza tão forte no mundo. Havia nela setenta e quatro franceses ao tempo que cheguei e alguns escravos; depois entraram mais de quarenta dos da nau [capturada] e outros que andavam em terra, e havia muito mais de mil homens dos que do gentio da terra, tudo gente escolhida e tão bons espingardeiros como os franceses." (Carta de Mem de Sá à Rainha-regente de Portugal, Catarina de Áustria (1557-1562), em 16 de Junho de 1560. RIHGB. Rio de Janeiro: Tomo XXVII Parte I, 1864. p. 13-15)
A excelência estratégica do local determinou que, posteriormente, ali fosse erguida uma nova estrutura defensiva pelos portugueses, a Fortaleza de Villegagnon.
[editar] Bibliografia
- ANCHIETA (S. J.), Joseph de (Pe.). De Gestis Mendi de Saa. São Paulo: Edições Loyola, 1986. 344p. il. p/b.
- LÉRY, Jean de. Viagem à Terra do Brasil. São Paulo: Livraria Martins Editora; Editora da Universidade de São Paulo, 1972. 258p. il.
- THEVET, André. Les singularitez de la France Antarticque, autrement nommée Amerique: (et) de plusieurs terres (et) isles decouvertes de nostre temps. Paris, 1557.
[editar] Ver também
- França Antártica
- Invasões francesas do Brasil
- Nicolas Durand de Villegagnon
- André Thevet
- Jean de Léry